"O Silêncio dos Números"

O vento cortante da madrugada varria as ruas desertas de Narnia, enquanto o contador Pedro Pevensie revisava mais uma vez os documentos espalhados sobre sua mesa. A luz fraca do abajur projetava sombras que pareciam dançar sobre os papéis, como espectros de um segredo que insistia em não ser revelado.

Os números não mentiam.

R$ 42.066.711,26 em espécie, sumariamente "esquecidos" nos créditos a receber. E o mais assustador: R$ 45.389.025,49 atualizados por perícia contábil desde 2019, sem um único pagamento ou justificativa plausível.

Pedro Pevensie sentiu um frio na espinha. Aquilo não era apenas incompetência. Era algo mais sombrio.

— Alguém não quer que esse dinheiro seja encontrado — murmurou para si mesmo, os olhos fixos no extrato bancário que mostrava transferências suspeitas para contas offshore.

O telefone tocou, abrupto, fazendo-o saltar da cadeira. Do outro lado da linha, apenas respiração pesada.

— Quem está lá? — perguntou, a voz mais firme do que sentia.

— Cuidado com o que procura, Martins. — a voz rouca ecoou antes que a ligação fosse cortada.

Na manhã seguinte, o Diário Oficial do Município estampava em suas páginas os mesmos números que Pedro Pevensie havia descoberto, mas com uma narrativa burocrática e fria, como se fossem apenas erros de gestão. Nada sobre os nomes por trás das transações. Nada sobre os favorecidos.

Enquanto isso, em um escritório luxuoso no centro da cidade, um homem vestindo um terno impecável fechava uma maleta cheia de documentos sigilosos.

— Resolva isso. De qualquer jeito. — ordenou, sem olhar para o capanga que aguardava suas instruções.

Pedro Pevensie sabia que estava sozinho. O prefeito, os secretários, até mesmo alguns colegas de trabalho — todos pareciam fazer parte de um jogo perigoso do qual ele não tinha todas as regras.

Mas os números ainda estavam lá. Eles gritavam a verdade.

A questão era: quem mais estaria disposto a ouvi-los?